Mártires de Guadalajara - Relato do martírio





















RELATO DO MARTÍRIO DE TERESA DO MENINO JESUS, PILAR E MARIA ÁNGELES

(O que si segue – disse a autora- o relato do martírio de nossas três religiosas, é a cópia do relato que mandamos ao O Monte Carmelo para ser publicado no mês de novembro de 1939)
Então as irmãs Teresa do Menino Jesus (que tinha vinte e sete anos de idade e onze de profissão) se ofereceu para acompanhar a irmã Pilar e a irmã Ángeles a casa de uma conhecida sua, certa de que as receberiam com gosto. Seriam quatro da tarde quando saíram de casa e, passado algum tempo, quem sabe uns quinze ou vinte minutos, ouvimos umas explosões ali próximo que nos sobressaltaram, e rezamos uma Salve por aqueles “pobres que acabaram de cair”, sem suspeitar que “aqueles pobrezinhos”, eram nossas irmãs! Nossa angústia e temor foram grandes quando soubemos que acabaram de fuzilar as três religiosas na rua, e este temor ia aumentando ao ver que se passavam as horas e a irmã Teresa não voltava, como o que foi combinado.
Infelizmente este temor se converteu em uma triste realidade. O que nos contaram as testemunhas foi o seguinte. Como nossas irmãs encontraram fechada a casa aonde iriam( que ficava na rua Francisco Cuesta), retornaram, subindo pela rua Miguel Fluiters. Um pouco mais acima do Hotel Palace, situado na dita rua, estava parado um automóvel no qual havia um grupo de milicianos e milicianas vestidos de “monos” (uniformes de associações de trabalhadores). Tinha nas mãos enormes machados que causavam enorme pavor e estavam comendo. Quando nossas religiosas iam chegando próximo do automóvel, uma miliciana, ao vê-las, disse: “Essas são monjas, atirem nelas”. Todos saíram do carro precitadamente dirigindo-se para elas, mas as pobrezinhas, atemorizadas, voltaram no intento de sair pela rua Francisco Cuesta; mas aqueles facínoras, ao chegar quase em frente ao hotel, lhes apontaram os fuzis e dispararam.
A irmã Àngeles e a irmã Pilar caíram no chão quase na esquina da dita rua. A primeira dizem que morreu no ato e a irmã Pilar começou a gritar com excessivas dores. A cena era estarrecedora. Juntou muita gente, como acontece em tais situações, para presenciar o sangrento espetáculo. Conduziram a pobrezinha a uma farmácia, situada quase em frente, precisamente quando o dono do estabelecimento, temendo a excitação popular, ia baixando as portas. Ao ver seu estado, disse que ali não podiam fazer nada, que a levassem a Cruz Vermelha. Ao passar um carro, o fizeram parar para que a transportasse; mas no que ia puxando o punhal, lhes disse: “tragam-nas aqui, que eu as matarei”. Então um dos presentes, indignado, exclamou: “Que bestas!”. O carro seguiu o seu caminho e, quem sabe meia hora depois do trágico acontecimento, passaram outros que a recorreu.
A irmã Ángeles a levaram para o cemitério e a irmã Pilar foi levada em uma ambulância, escoltada pela guarda da Cruz Vermelha, que estavam instaladas na praça Marlasca. Na praça se fizeram aglomerações de todas as milícias ferroviárias e milicianos vindos de Madrid para a tomada de Guadalajara, verificada dois dias antes pelo exército vermelho. Os ânimos estavam mais exaltados que se podem imaginar, e nossa querida irmã foi o alvo do ódio daquelas multidões enfurecidas, pois, ao verem a ambulância que levavam uma monja começaram a gritar:” Matem-na, matem-na!”. Deste modo nosso Senhor associou a vítima a sua dolorosa paixão, fazendo-a participante de sua crucificação.
Na Cruz Vermelha levaram para a mesa de cirurgia para avaliação. Uma bala rompeu a sua coluna vertebral e outra atravessou a barriga. A pernas caiam para todos os lados, e um joelho, e também um ombro estavam destroçados por balas. Todo o seu corpo estava em um lastimável estado. Dizem que também tinha sinais de ferimentos nas costas e que havia levado uma facada na cintura deixando o um rim amostra pelo ferimento. Estava em estado de agonia, com os olhos perdidos, como que desatinada angustia que sentia e pelas grandes dores, não cessava de repetir:” Que aflição! Sede. Mas, que fiz eu para que me tratem assim? Deus meu, perdoe-os pois não sabem o que fazem!”
A exemplo de seu Divino Esposo, aos gritos de ódio de seus inimigos, saiam de sua boca palavras cheias de perdão e amor. Era uma cena arrasadora. E não somente as pessoas da Cruz Vermelha que a cuidavam com caridade, mas também outras que depois de manifestar sua idéias comunistas, estavam comovidas e derramavam lágrimas de compaixão que se somavam aos olhos de alguns dos presentes; mas o terror era tal que nem sequer se atreveram a libertarem pelo medo que fossem julgados com um ato de protesto que poderia lhes custar a vida, medo muito justificado, pois a apenas alguns passos da praça, a agitação e tumulto reinavam e era capaz de amedrontar o ânimo mais corajoso. Mas naqueles trágicos momentos quem mais sofria era nossa querida irmã Pilar ao dar-se conta que estava entre homens. Isto somente poderá compreender bem que conhecia sua maneira de ser neste ponto.
A senhorita Maria Carrasco, dentista de profissão, que havia oferecido seus serviços a Cruz Vermelha, estava presente e com grande caridade sustentava os seus braços, colocando alguns pedaços de gelo em sua boca para aliviar sua sede. Ao perceber a nossa irmã, por sua vez, que era uma mulher que estava ao seu lado, a pesar de sua agonia, fazendo um angustiante esforço, levantou a cabeça e agarrando-se a ela como a uma tábua de salvação, lhe disse em tom suplicante e aflito: “Não me deixe!” Ao ver sua aflição o médico que estava presente – o inspetor provincial de saúde – Dom Luis Suárez de Puga, pessoa de muitas boas qualidades - , impressionado, disse para a tranquilizá-la: “Não se apavore, que nossos estamos cuidando de você.”
Como seu estado era desesperado, pois já estava morrendo não puderam realizar nenhuma cirurgia, limitaram apenas a envolvê-la com gazes e algodão para que o sangue não escorresse pela rua, e entre três ou quatro pessoas a colocaram em uma maca para que fosse levada ao hospital e não morresse ali. Desde então, não se voltou a falar mais nada e ali permaneceram até que a multidão amotinadas se retirassem para que fossem até o hospital.
Dos seus últimos momentos sabemos o seguinte da boca de uma irmã de caridade que estava no hospital e que assistiu o seu último suspiro. Quando chegou, um dos médicos disse baixinho a essa religiosa: “É uma monja”. Então a levaram a uma sala retirada a religiosa e um enfermeiro que a cuidaram e perceberam que seu corpo estava destroçado e a túnica de lã (que não lhe foi tirada) toda ensopada de sangue. A colocaram em uma cama e a religiosa, muito baixo para não ser ouvida, lhe disse algumas ejaculatórias. Quem sabe os cinco minutos de sua chegada, expirou nos braços desta amorosa irmã exclamando uma vez mais: “Deus perdoa-os eles não sabem o que fazem!” Deste modo entregou sua bela alma a Deus, para receber a palma do martírio. Seu corpo levado na mesma tarde para o cemitério onde foi enterrada em uma cova comum com outros mortos. Tendo a idade de 58 anos e 38 de vida religiosa. Era chamada de irmã María Pilar de San Francisco de Borja e era natural de Tarazona (Saragoza).
Agora nos referiremos ao acontecido a nossa querida irmã Teresa do Menino Jesus. Ao disparo dos tiros, quando caíram as outras religiosas, a pobrezinha assustada não sabendo onde se refugiar-se, tentou entrar no Hotel Palace, mas à porta estavam vários milicianos que a impediram de entrar. Neste crítico momento apareceu ali um miliciano chamado Raimundo Palero, até o presente refugiado na França, homem de baixos sentimentos e idéias comunistas bem acentuadas, a qual, o qual, ao ver aquele alvoroço perguntou: “Que se passa?” Depois de ser inteirado do que se tratava aproximou da irmã Teresa deu-lhe o braço e, procurando enganá-la, lhe disse com irônica compaixão: “Esses são uns bárbaros. Não têm cuidado com a senhora, eu a levarei aonde não lhe acontecerá nada.” E dizendo isto, jogou-a na rua que vai para o cemitério. O que no caminho se passou, não sabemos ao certo; mas muito sofreu nossa irmã conhecendo os seus maus intentos.
São variadas as coisas que foram sido referidas, mas não as relataremos aqui porque não nos foram constadas pelas testemunhas oculares. Sem demora, uma pessoa digna de fé nos afirmou que uma amiga sua, professora e que agora esta ausente, a viu no caminho do cemitério acompanhada dos comunistas, entre eles esse tal Palero, o qual ia fazendo gestos aos outros que aquela era para ele e que, obrigando-a a gritar: “Viva o comunismo, viva Azaña!, e outras coisas sobre o comunismo, ela respondia com intrepidez: “Viva Cristo Rei!”, “Viva o Coração de Jesus!”.
Desde o primeiro dia as outras pessoas contaram quase o mesmo, ainda que com algumas variantes. Também afirmaram que ela enfrentou os assassinos e lhes jogou na cara a covardia de terem matado as duas religiosas indefensas. Tudo isto pode ter acontecido, mas durante o trajeto, e não no mesmo lugar onde elas foram fuziladas. O que sabemos ao certo é o que foi contado por uma testemunha ocular, o senhor Olmeda, agente funeral nesta cidade. Ia ao cemitério este senhor levando uma caixa. Estando já relativamente próximo, ao desembocar na rua que vai para o cemitério, viu que mais adiante iam três indivíduos que levavam a irmã Teresa, e, antes de chegar ao primeiro banco de pedra, ela se pôs a correr com os braços em cruz gritando: “Viva Cristo Rei!”, como se quisera separar-se daquela impura companhia para cair nos braços de seu Esposo celestial.
Então, um deles, o já citado Palero, apontou lhe o fuzil e disparou. Ao receber os tiros pelas costas, caiu ao chão. Eles aproximando-se, revistaram uma maleta que levava, mas não encontraram mais que um livro, umas estampas, um rosário, ect. Os jogaram no chão e se foram. O senhor Olmeda, que enquanto tudo se passava havia se escondido na esquina, prosseguiu seu caminho. Ao passar junto de nossa mártir, se deteve e viu que saia sangue pela boca e estava em convulsão. Olhou para maleta, porém não se atreveu a pegar nada e a deixou no mesmo lugar. Ao chegar no cemitério, comunicou o ocorrido ao zelador, o qual contestou: “ Abandou a senhora; era uma monja que eles mataram!” Este infeliz foi condenado a morte no ano de 1940, sendo fuzilado na cidade de Guadalajara.
Quando o senhor Olmeda voltava a sua casa, ia de tal maneira impressionado que, ao chegar onde ela estava, passou junto a parede sem olhar. Quem sabe meia hora depois, ou um pouco mais, teve que ir levar outra caixa e já a encontrou dentro do cemitério, morta no chão. Ali a jogaram como se fosse um saco. Estava muito branca, com um branco cadavérico, e com os olhos fechados. Dizem que o senhor se aproximou dela para olhar e naquele momento, certamente por causa de alguma contração muscular, abriu os olhos permanecendo com eles abertos. Tinha a irmã Teresa do Menino Jesus 27 anos de idade e onze de vida religiosa e era natural de Mochales (Guadalajara). Quando entrou aos 16 anos era uma excelente organista.
Estes são os únicos dados que temos recolhido a respeito de nossas irmãs mártires, depois de terminada a terrível tormenta comunista, pois as testemunhas de outras coisas que aconteceram estão refugiadas na França ou presos por estes ocorridos e, por tanto impossibilitados de nos dar qualquer informação verídica.

Daniel de Pablo Maroto, ocd, Martirio em Guadalajara-relato de uma testigo
Revista de Espiritualidad nº 271 abril/Junho de 2009

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